QUEIXAS E RESSENTIMENTOS -
ECKHART TOLLE
Queixar-se
é uma das estratégias prediletas do ego para se fortalecer. Cada
reclamação é uma pequena história que a mente cria e na qual acreditamos
inteiramente. Não importa se ela é feita em voz alta ou apenas em pensamento.
Alguns egos que talvez não tenham muito mais com o que se identificar
sobrevivem apenas com queixas. Quando estamos presos a um ego assim, reclamar,
sobretudo de alguém, é algo habitual e, é claro, inconsciente, o que mostra que
não sabemos o que estamos fazendo. Uma atitude típica desse padrão é aplicar
rótulos mentais negativos às pessoas, seja na frente delas ou, como é mais
comum, falando sobre elas com alguém ou até mesmo apenas pensando nelas. Xingar
é o modo mais rude de atribuir esses rótulos e de mostrar a necessidade que o
ego tem de estar certo e triunfar sobre os outros: "idiota",
"desgraçado", "prostituta", todas essas afirmações
definitivas contra as quais não se pode argumentar. No nível seguinte, descendo
pela escala da inconsciência, estão os gritos. Não muito abaixo disso, se encontra
a violência física.
O
ressentimento é a emoção que acompanha a queixa e a rotulagem mental dos
outros. Ele acrescenta ainda mais energia ao ego. Ressentir-se significa estar
magoado, melindrado ou ofendido. Costumamos nos sentir assim em relação à
cobiça das pessoas, à sua desonestidade, à sua falta de integridade, ao que
estão fazendo no presente, ao que fizeram no passado, ao que disseram, ao que
deixaram de dizer, à atitude que deviam ou não ter tomado. O ego adora isso. Em
vez de detectarmos a inconsciência nos outros, nós a transformamos em sua
identidade. Quem é o responsável por isso? Nossa própria inconsciência, o ego.
Algumas vezes, a falta que apontamos em alguém nem mesmo existe. Ela pode ser
um erro total de interpretação, uma projeção feita por uma mente condicionada a
ver inimigos e a se considerar sempre certa ou superior. Em outras ocasiões, a
falta pode ter ocorrido; contudo, se nos concentrarmos nela, às vezes excluindo
todo o resto, nós a tornamos maior do que é. E dessa maneira fortalecemos em
nós mesmos aquilo a que reagimos no outro.
Não
reagir ao ego das pessoas é uma das maneiras mais eficazes de não só superarmos
nosso próprio ego como também de dissolver o ego humano coletivo. No entanto,
só conseguimos nos abster de reagir quando somos capazes de reconhecer o
comportamento de alguém como originário do ego, como uma expressão do distúrbio
coletivo da espécie humana. Quando compreendemos que não se trata de nada
pessoal, a compulsão para reagir desaparece. Não reagindo ao ego, muitas vezes
podemos fazer aflorar a sanidade nos outros, que é a consciência não
condicionada em oposição à consciência condicionada. Em determinadas ocasiões,
talvez precisemos tomar providências práticas para nos proteger de pessoas
profundamente inconscientes. Isso é algo que temos condições de fazer sem
torná-las nossas inimigas. Nossa maior defesa, contudo, é sermos conscientes.
Alguém passa a ser um inimigo quando personalizamos a inconsciência que é o
ego. A não reação não é fraqueza, mas força. Outra palavra para a não reação é
perdão. Perdoar é ver além, ou melhor, é enxergar através de algo. É ver,
através do ego, a sanidade que há em cada ser humano como sua essência.
O
ego adora reclamar e se ressente não só de pessoas como de situações. O que
podemos fazer com alguém também conseguimos fazer com uma circunstância:
transformá-la num inimigo. Os pontos implícitos são sempre: "isso não
deveria estar acontecendo", "não quero estar aqui", "estou
agindo contra a minha vontade", "o tratamento que estou recebendo é
injusto". E, é claro, o maior inimigo do ego acima de tudo isso é o
momento presente, ou seja, a vida em si.
Não
confunda a queixa com a atitude de informar alguém de uma falha ou de uma
deficiência para que elas possam ser sanadas. Além disso, abster-se de reclamar
não corresponde necessariamente em tolerar algo de má qualidade nem um mal
comportamento. Não há interferência do ego quando dizemos ao garçom que a
comida está fria e precisa ser aquecida - desde que nos atenhamos aos fatos,
que são sempre neutros. "Como você se atreve a me servir uma sopa
fria?" Isso é se queixar. Nessa situação, existe um "eu" que
adora se sentir pessoalmente ofendido pela comida fria e ele aproveitará esse
fato ao máximo, um "eu" que aprecia apontar o erro de alguém. A
reclamação a que me refiro está a serviço do ego, e não da mudança. Algumas
vezes fica óbvio que o ego não deseja que algo se modifique para que possa
continuar se queixando.
Veja
se você consegue capturar, ou melhor, perceber, a voz na sua cabeça - talvez no
exato instante em que ela esteja reclamando de algo - e reconhecê-la pelo que
ela é: a voz do ego, não mais que um padrão mental condicionado, um pensamento.
Sempre que a observar, compreenderá que você não é ela, e sim aquele que tem
consciência dela. Na verdade, você é a consciência que está consciente da voz.
Atrás, em segundo plano, está a consciência. À frente, se situa a voz, aquele
que pensa. Dessa maneira você está se libertando do ego, livrando-se da mente
não observada. No momento em que você se tornar consciente do ego, a rigor ele
não mais será ego, e sim um velho padrão mental condicionado. O ego implica
inconsciência. Ele e a consciência não podem coexistir. O velho padrão mental,
ou hábito mental, pode sobreviver e se manifestar por um tempo porque tem o
impulso de milhares de anos de inconsciência humana coletiva atrás de si. No
entanto, toda vez que é reconhecido, ele se enfraquece.
Do livro "Um novo mundo - o
Despertar de uma nova consciência."
Uma excelente semana!
Maria Clara Melotto
&
Jeane Godoy
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